quarta-feira, 12 de março de 2014

ONGs protestam contra o consumo de carne de jumento


Organizações Não Governamentais (ONGs) de proteção animal no Rio Grande do Norte, registradas ou não, se unem em manifesto contra o abate e consumo de cerca de 600 jumentos retirados das estradas por policiais rodoviários. A proposta de destinar a carne de jumento para a alimentação de presidiários é do promotor Sílvio Ricardo Brito, da 2ª Promotoria de Apodi. (CliqueAqui e saiba mais).
Essa proposta será discutida nesta quinta-feira, dia 13, durante um almoço no município de Apodi. Segundo afirmam as organizações, o consumo da carne sem os devidos cuidados pode causar doenças ao ser humano e também a extinção dos animais.
Segundo os veterinários e membros da ONG mossoroense Defesa da Natureza e dos Animais (DNA), Kátia Regina e Kléber Jacinto, a carne do jumento pode ser sim consumida, mas não da forma como está sendo feita, sem manejo e cuidados adequados. Além disso, existe o risco da extinção.
A veterinária explica que diferente de outros animais usados para o consumo humano como a vaca e cabras, que estão prontos para o abate em poucos meses, um jumento pode ser abatido após três anos, e também a gestação dura muito mais. E garante que não é economicamente viável a criação em massa desses equinos para alimentação.
Os protetores questionam as condições em que se encontram esses animais que serão usados no almoço e posteriormente na alimentação dos presidiários e crianças. "São animais capturados nas estradas em diversas condições, não se sabe o histórico de doenças do animal", ressalta Kátia.
Além disso, os protetores afirmam que em contato com o possível veterinário responsável pelo cuidado e abate dos 600 jumentos, o mesmo confirmou que foi exonerado do cargo no município de Apodi e que por isso não é o responsável técnico pelos animais.
Kléber Jacinto explica ainda que os animais capturados pela entidade de proteção, responsável pelo recolhimento de mais de 600 animais, criada pelo promotor Sílvio Brito em parceria com as polícias rodoviárias Federal e Estadual são enviados para a Fazenda do senhor Eridalvo de Jesus, e que este último confirmou não ter recebido apoio do poder público.
O dono da fazenda também teria confirmado que não tem nenhum veterinário enviado pela promotoria para cuidar dos animais.
Ainda de acordo com os protetores, existe um laudo técnico feito por uma equipe de professores da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA) e que ainda não teve o resultado divulgado. No entanto, eles afirmam que os veterinários que foram ao local para examinar os animais para fazerem o laudo, adiantaram em conversa que os jumentos estão em condições inadequadas. "São animais vivos, mortos, doentes, sadios, recém-chegados, todos juntos", afirma Kátia. "A gente vê que o dono da fazenda é uma pessoa que tem interesse em ajudar os animais, mas que tem uma quantidade muito grande que ele não dá conta e o poder público não ajuda, não dá apoio. Matar os jumentos para o consumo foi a solução encontrada pela promotoria", ressalta Jacinto.
Os veterinários dizem que a carne de qualquer animal precisa ser consumida dentro das condições sanitárias e manejo adequado, o que não estaria acontecendo no caso do consumo dos 600 jumentos em Apodi. "Por semana morrem cerca de 20 a 25 jumentos nessa fazenda. Morrem de quê? É de fome? É de doença? Há indícios de que esses animais estejam contaminados com Botulismo, Brucelose e o temido Mormo. Esta última é uma doença assintomática no jumento e todas podem ser transmitidas ao ser humano através do consumo inadequado.

EXTINÇÃO DA ESPÉCIE E CULTURA NORDESTINA

Kléber Jacinto diz que a carne de jumento já foi consumida anteriormente no Nordeste, por volta dos anos 70. Criadores chegaram a tentar colocar a carne do animal na cultura gastronômica, mas devido principalmente a pouca produção e retorno econômico, os próprios criadores abandonaram esses animais, o que também contribuiu para o aumento do número deles soltos nas estradas.
Os veterinários temem que a extinção do jumento seja causada pelo o consumo da carne do animal. Segundo Kátia, existem estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística que comprovam que o número de jumentos está diminuindo no Brasil. E caso entrem para a alimentação das pessoas, esse número pode diminuir ainda mais até chegar à extinção, visto que o animal precisa de um maior tempo para se reproduzir, e cada fêmea tem apenas um filhote por gestação. "Não tem jumento suficiente", diz.
Além da questão ambiental, o cultural também conta muito. A veterinária Kátia diz que o jumento é um símbolo do Nordeste, da cultura nordestina. "Já é um animal ameaçado de extinção, o número deles é muito restrito", ressalta.
Foi usando esses e outros argumentos que no ano passado a ONG DNA juntamente com o Professor Fernando Viana da Associação Brasileira de Criadores de Jumentos e ainda a União Internacional Protetora dos Animais (UIPA) do Ceará, conseguiram embargar a exportação de jumentos para a China.
Para Kléber Jacinto é preciso uma discussão mais aprofundada sobre o problema. "Quem está acompanhando e examinando esses animais? Qual o benefício? Vai ser feito um criadouro desses animais? Ou é apenas uma medida para baratear a alimentação de presos e crianças carentes", indaga.
Kátia explica também que nas estradas são vistos muitos jumentos justamente porque esses animais não são consumidos na alimentação humana. O incentivo ao consumo da carne pode fazer com as pessoas passem a matar esses animais sem os cuidados necessários, e isso causar a transmissão de doenças dos equinos.
ONGS
Além da DNA, as ONGS Amigos de Pelo, Patamada, Amimais, Focinhos Felizes Potiguares e Protetores independentes de todo o RN, assinam uma carta aberta que expõe o contexto histórico do problema, aponta falhas na "solução" através do abate e deixa clara a necessidade de discussão mais profunda acerca do fato.
O fato também mobiliza não somente protetores, mas também a sociedade em geral. O poeta Jadson Xavier fez versos sobre a questão do consumo da carne do jumento.

Fonte: Jornal de Fato

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